segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Complexidade tributária é prejudicial a todos

O Brasil é reconhecido pela sua complexidade tributária, o que faz com que a população, de modo geral, não tenha um conhecimento exato da realidade dos impostos brasileiros. As empresas precisam cumprir, em média, cerca de três mil diferentes normas tributárias, de acordo com a advogada tributarista Letícia Mary Fernandes do Amaral, vice-presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT). Segundo ela, esse fato leva a constantes erros no cumprimento de obrigações acessórias, o que, muitas vezes, impacta no próprio recolhimento do tributo. Dessa forma, explica, aumenta-se cada vez mais o número de emissão de autos de infração com pesadas multas e, consequentemente, o crédito a ser recuperado pelo fisco. Além disso, a complexidade tributária impede o aumento do consumo dos mais pobres e faz com que a classe média tenha gastos em dobro.

JC Contabilidade – O que é preciso para simplificar a legislação tributária no Brasil?

Letícia Mary Fernandes do Amaral – É necessário, principalmente, que o governo tenha o desejo de se mobilizar nesse sentido, reduzindo o número de obrigações acessórias a serem observadas pelas empresas; que desonerem as atividades produtivas do País, diminuindo alíquotas de alguns tributos e eliminando outros. Para haver uma simplificação mais ampla é preciso uma reforma constitucional, tendo em vista as tentativas falhas do governo e prejudiciais aos contribuintes. Não somos a favor de uma reforma para a diminuição e simplificação, mas, sim, de medidas pontuais, que afetem todos os setores da economia e que tragam redução de obrigações acessórias, alargamento do prazo de recolhimento de tributos como PIS e Cofins, redução de alíquotas de impostos como o IPI.

Contabilidade – O ICMS tem uma das legislações mais complexas. O que o governo deveria fazer para melhorar essa questão?

Letícia – A legislação do ICMS é realmente muito complicada, pois não é uma legislação unificada, já que cada um dos 26 estados e o Distrito Federal têm competência para legislar nessa matéria.

Sendo assim, faz com que contribuintes que atuem em diversos estados tenham que ter o
conhecimento de uma infinidade de normas (protocolos, convênios, leis estaduais, decretos etc), gerando insegurança jurídica em relação a possíveis autuações fiscais. E isso só poderia ser modificado se houvesse alteração na Constituição Federal.

Além disso, deveria haver uma definição no âmbito do Confaz sobre como os estados devem conceder benefícios fiscais. Tal definição deveria ser atingida de forma a possibilitar seu amplo cumprimento por parte dos estados. Ainda pode-se citar a urgente necessidade de não mais penalizar o contribuinte por inconstitucionalidades e ilegalidades cometidas pelos estados, como vem reiteradamente acontecendo em matéria de glosa de créditos de ICMS advindos de estados concedentes de incentivos fiscais considerados inconstitucionais.

Contabilidade – A bitributação vem sendo um dos temas bastante questionados judicialmente. Qual seria a solução para esses conflitos?

Letícia – Novamente se atribui a culpa da existência de conflitos de competência entre entes políticos à má qualidade da legislação brasileira. As leis, por suas más redações, acabam gerando interpretações dúbias em relação a quem detém a capacidade tributária para a exigência de determinado tributo. É o que ocorre normalmente em matéria de ISS e ICMS, e sobra para o Judiciário definir tais questões, mas quem arca com as nefastas consequências é sempre o contribuinte, que vive na constante insegurança jurídica. A solução seria o aprimoramento da qualidade do processo legislativo tributário de forma geral, bem como a edição de súmulas vinculantes relacionadas aos diversos casos de bitributação jurídica que já foram apreciados reiteradamente pelo STF. Além disso, é sempre bom ressaltar que os entes tributantes deveriam lidar com melhor senso nesses casos, até mesmo negociando com eventuais entes conflitantes, sem deixar que o contribuinte arque com os prejuízos de ser cobrado duplamente.

Contabilidade – A senhora é a favor dos incentivos fiscais concedidos pelos estados?

Letícia – Sou favorável, desde que sejam concedidos de forma constitucional e legal, trazendo, assim, segurança jurídica aos contribuintes afetados por tais incentivos. Creio que a concessão de incentivos fiscais estimula competitividade entre os estados e promove o desenvolvimento de regiões que normalmente não atrairiam grandes investimentos caso não fossem incentivadas.

Contabilidade – Qual é a razão de o País ter uma das mais elevadas cargas tributárias do mundo?

Letícia – Como temos uma tributação intensa sobre o consumo, a alta tributação impede que os preços dos produtos possam ser mais baixos, e que os produtos, mercadorias e serviços sejam mais acessíveis para uma boa parcela da população, que tem menor poder aquisitivo. Na medida em que a carga tributária é considerada elevada, em qualquer padrão comparativo, inibe os investimentos externos e também prejudica o empreendedorismo em nosso próprio país. Nessa situação, os países que não apresentam este panorama têm melhores condições negociais no mercado. O Brasil tem uma carga tributária que está em nível de países desenvolvidos, maior do que a dos Estados Unidos e Japão, por exemplo, e o retorno social é pior do que em muitos países de menor importância no cenário mundial, inclusive alguns da América do Sul, como Argentina, Uruguai e Chile.

Contabilidade – O que seria a justiça tributária?

Letícia – Para a formação de um sistema tributário justo, faz-se imprescindível que ele apresente algumas características essenciais. Tais características vêm sendo estudadas desde muito tempo e ficaram particularmente célebres através dos ensinamentos de Adam Smith, os quais influenciaram todo o mundo ocidental. Segundo o referido filósofo e economista, as máximas da tributação são: igualdade, certeza, conveniência e eficiência. A contribuição proporcional à renda de cada indivíduo, para manter e suportar a carga tributária de um país, é condição sine qua non para um sistema justo, baseado na igualdade de tratamento entre contribuintes que se encontram na mesma situação. E igualmente baseado no tratamento desigual entre eles, na proporção de suas respectivas desigualdades. Assim, a capacidade contributiva constitui o pilar dessa questão. Ele deve ser necessariamente um sistema progressivo, no qual o tributo é determinado em proporção crescente à riqueza ou a renda do contribuinte. Isso, infelizmente, não ocorre no Brasil, que adota o regressivo, no qual a carga tributária aumenta ou a renda do contribuinte diminui.

Contabilidade – Tomamos como exemplo a aquisição de um carro no Brasil, quando cerca de 50% do seu valor é composto por impostos. Como seria em um Brasil ideal e justo?

Letícia – Não teria um sistema tributário regressivo, mas concentraria a tributação sobre a renda e o patrimônio de seu povo, privilegiando a capacidade contributiva de cada pessoa. Isso já faria com que a tributação sobre o consumo, em geral, fosse mais amena, equivalendo a da média dos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que gira em torno de 33% da arrecadação, enquanto no Brasil chega a quase 50%.

Fonte: JC RS via www.juraniomonteiro.com/ joseadriano.com.br


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